Segunda-feira

VALOR ECONÔMICO

Investimentos das capitais recuam 63% no ano

Os investimentos das prefeituras das capitais caíram 63,23% de janeiro a agosto contra igual período de 2016. A queda de investimentos no primeiro ano de mandato em relação ao ano de eleições é considerada natural, mas a magnitude mostra que o recuo este ano foi intensificado pela retração da economia, ainda em lenta recuperação, e pelo acesso mais difícil a financiamentos e transferências de capital.

Em igual período de 2013, também primeiro ano de mandato dos prefeitos eleitos em 2012, os investimentos das capitais caíram, mas a uma taxa menor, de 28,6%. Os relatórios revelam que o ajuste em um ano com receitas apertadas e necessidade de contenção de gastos foi baseado principalmente nos investimentos. De janeiro a agosto, a receita corrente agregada das capitais cresceu 3,04%. As despesas correntes aumentaram mais,

em 3,57%. As despesas de pessoal exerceram uma pressão maior. No Executivo, esses gastos subiram 5,88% nos 12 meses encerrados em agosto. Os dados foram extraídos pelo Valor de relatórios fiscais enviados por 26 capitais ao Tesouro Nacional. Foram consideradas receitas correntes primárias e despesas correntes liquidadas informadas nos relatórios de execução orçamentária.

Os dados de despesa de pessoal foram tirados do relatório de gestão fiscal. Sol Garson, professora do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-secretária de Fazenda do município do Rio de Janeiro, diz que o investimento é sempre a variável de ajuste quando é preciso equilibrar receitas e despesas.

As prefeituras, diz ela, ainda enfrentam a crise no setor de serviços, o que derruba a arrecadação própria, ao mesmo tempo em que as transferências dos Estados, via ICMS, ainda não se recuperaram. Em meio a um processo de forte ajuste, a União, destaca Sol, não tem recursos para as transferências de capital que são importantes para sustentação de investimentos das prefeituras. "Esse gasto, portanto, depende agora da poupança própria, que não existe, porque as receitas ainda não reagiram e as despesas sobem. As prefeituras estão vivendo uma situação difícil e a inflação baixa agrava ainda mais a situação", afirma.

Muitas despesas, como salários, exemplifica ela, foram reajustadas pela inflação do ano passado e a arrecadação deste ano é sobre preços que variam com inflação bem mais baixa. A variação do IPCA no ano passado foi de 6,29%.

Caio Megale, secretário de Fazenda de São Paulo, diz que despesas obrigatórias correntes reajustadas pela inflação, como convênios nas áreas de saúde, educação e assistência social, tendem a pressionar mais os gastos. Segundo ele, a soma de R$ 1 bilhão em receitas extraordinárias que a prefeitura deve arrecadar este ano por conta de um parcelamento de tributos garantirá ao município fechar 2017 com superávit financeiro.

Com as receitas apertadas, um dos indicadores que têm se deteriorado é o dos gastos com pessoal. Os relatórios das 26 capitais mostram que em 15 delas houve avanço na fatia da despesa bruta de pessoal do Executivo em relação à receita corrente líquida nos últimos 12 meses encerrados em agosto, na comparação com os 12 meses anteriores.

Das 26 capitais, 12 romperam algum dos limites para os gastos com folha estabelecidos pela normas fiscais para o Poder Executivo até agosto. Em cinco capitais - Belém, Teresina, Recife, Curitiba, Porto Velho e Porto Alegre - as despesas de pessoal ultrapassaram o limite de alerta de 48,6% da receita corrente líquida. Em outras cinco - Campo Grande, Cuiabá, Macapá, São Luís e Rio de Janeiro - foi superado o limite prudencial, de 51,3%. E duas, Natal e Florianópolis, romperam o teto de 54%.

O descompasso entre a evolução das receitas e a dos gastos com folha levaram ao avanço do índice fiscal de despesa de pessoal do município do Rio, explica a secretária de Fazenda da capital fluminense, Maria Eduarda Gouvêa Berto. As despesas de pessoal do Executivo avançaram em apenas um ano 7,88 pontos, de 45,53% para 53,41% da receita corrente líquida na comparação de 12 meses encerrados em agosto.

Com o novo índice, o Rio se aproxima do teto de 54% para o teto de gastos com folha definido pelas normais fiscais. Como a receita diminuiu, houve redução do denominador nesse indicador, diz a secretária. Ao mesmo tempo, o numerador, dado pela despesa de pessoal, avançou.

As receitas extraordinárias resultantes de venda de folha e de parcelamentos oferecidos pelo município, porém, diz ela, ainda não captadas pelos relatórios finalizados em agosto, devem melhorar os indicadores até o fim do ano. A queda de receitas, diz Maria Eduarda, pode ser explicada em parte pela alta base de comparação do ano passado e pelo nível de atividade. Em 2016, exemplifica, o município resgatou depósitos judiciais, receita extraordinária que não se repetiu este ano.

Além disso, a arrecadação do Imposto sobre Serviços caiu como reflexo da atividade econômica. "Essa arrecadação é muito sensível ao emprego e o município do Rio de Janeiro perdeu 45 mil postos de trabalho de janeiro a julho."

Também houve redução de ingressos de operações de crédito, lembra a secretária, que caíram de R$ 605 milhões no ano passado para R$ 335 milhões neste ano. As entradas de recursos de financiamentos no ano passado foram naturalmente maiores em 2016 por conta da Olimpíada. Com receitas menores em caixa, as receitas patrimoniais, resultantes dos investimentos financeiros do município, diz Maria Eduarda, também caíram, com redução de 44% ao fim do segundo quadrimestre contra igual período de 2016.

Os investimentos na capital fluminense, seguindo igual tendência, despencaram de R$ 2,6 bilhões para R$ 198,8 milhões, com recuo de 92,36%. Até o fim do ano, diz a secretária, receitas extraordinárias devem ajudar a melhorar alguns indicadores do Rio. Ela cita R$ 223 milhões arrecadados com a venda de folha de pagamentos em setembro - que não foram captados pelos relatórios de agosto - e outros R$ 500 milhões que devem ser recolhidos até fim de 2017 em um programa de parcelamento.

Segundo os relatórios, as receitas primárias correntes da capital fluminense caíram 4,1% nominais de janeiro a agosto na comparação com iguais meses de 2016. No mesmo período as despesas correntes recuaram 1,82%, mas as de pessoal avançaram 7,7%, mostrando que o ajuste à queda das receitas se deu basicamente nas despesas de custeio. No início do ano, lembra Maria Eduarda, um decreto determinou corte de 25% nos contratos vigentes, o que permitiu parte do ajuste.

O crescimento dos gastos com pessoal, porém, diz ela, acabou sendo determinado já no fim do ano passado, com o reajuste aos servidores pela inflação de 2016. Para o ano que vem, afirma a secretária, as perspectivas são melhores. Além de operações de créditos e projetos de investimento já encaminhados, há expectativa de melhora da arrecadação com o avanço do PIB - de 0,5% este ano para alta de 2,5% em 2018.

A melhora de cenário deve repercutir, diz Maria Eduarda, especialmente na arrecadação do ISS enquanto o IPTU, cobrado sobre a propriedade de imóveis, deve render R$ 300 milhões adicionais em 2018 por conta de atualização na planta de valores. Outros R$ 300 milhões extras devem vir da elevação de alíquotas do ITBI, imposto cobrado sobre a comercialização de imóveis.

 

Queda da taxa de poupança afeta PIB potencial, diz economista do Fundo Verde

A perspectiva de um crescimento mais forte em 2018 não entusiasma o economista-chefe da Verde Asset Management, Daniel Leichsenring. Para ele, a recuperação cíclica, estimulada pelos juros baixos, deve levar a uma expansão de 2,5% a 3% em 2018, mas os problemas estruturais da economia continuam a impor obstáculos à capacidade de o país crescer a taxas mais altas de modo sustentado.

Na visão de Leichsenring, a forte queda da taxa de poupança doméstica nos últimos anos, puxada pelo setor público, tem implicações negativas sobre o crescimento potencial, a evolução das contas externas e a queda dos juros de longo prazo.

O economista cita ainda como problemas a demografia desfavorável e os maus investimentos feitos nos anos recentes. "Ainda não tenho elementos para achar que [o crescimento potencial] é muito melhor do que 1,5%", diz Leichsenring, ao falar da sua estimativa para o ritmo de avanço do PIB que não acelera a inflação.

Ele observa que, com a crise, a taxa de poupança doméstica caiu da casa de 18% para 14% do PIB. Segundo ele, isso ocorreu especialmente por causa da deterioração das contas públicas - o déficit nominal (que inclui gastos com juros) passou de 2% a 3% do PIB para a casa de 9% a 10% do PIB. A piora na poupança do setor público, diz, foi equivalente a sete pontos percentuais do PIB, enquanto a do setor privado aumentou de dois a três pontos do PIB.

O problema é que o governo optou por uma estratégia de ajuste gradual, o que significa que a poupança pública vai melhorar lentamente, ao passo que a do setor privado deve diminuir um pouco durante a retomada. "Nós deveremos ter um déficit em conta corrente maior para uma mesma taxa de investimento."

Se antes da crise o país teve um rombo na conta corrente de 4% do PIB com uma taxa de investimento de 21% a 22% do PIB, o país pode ter em alguns anos um rombo externo equivalente com uma formação bruta de capital fixo (medida do que se investe em máquinas e equipamentos, construção civil e inovação) na casa de 18% do PIB, avalia Leichsenring. "Isso diz que a taxa de investimento que conseguimos ter sem incorrer em vulnerabilidades externas é bem mais baixa do que no passado."

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Valor: O senhor demonstra há algum tempo uma visão estrutural pessimista. Isso continua?

Daniel Leichsenring: Em períodos de recessão muito profunda, como a que vivemos, é comum haver uma depreciação bem maior do estoque de capital do que você considera normalmente. Dou um exemplo. Houve quase 2% do PIB investidos no Comperj [Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro]. Segundo a própria Petrobras, o Comperj não vai ser usado na sua plenitude. A maior parte do Comperj não vai ser usada porque o custo de terminar a obra é muito maior do que o retorno esperado. O que foi investido está lá na formação bruta de capital fixo. Mas gera alguma atividade econômica?

Valor: Qual é a sua estimativa para o crescimento potencial?

Leichsenring: Ainda não tenho elementos para achar que é muito melhor do que 1,5% intertemporalmente. E nos próximos dez anos ainda teremos algum crescimento demográfico. Nos dez anos seguintes, em que a população em idade ativa começa a cair, o crescimento potencial vai de fato ser bem mais baixo. Na contramão, há um conjunto de reformas e tal, que obviamente melhora em relação ao que teríamos tido, mas o avanço é relativamente pequeno e difícil de mensurar.

Valor: A recuperação tem sido puxada pelo consumo das famílias. Isso vai continuar?

Leichsenring: Continua, porque primeiro a desalavancagem das famílias está ocorrendo e, ao longo do ano, é bem razoável que se encontrem numa situação melhor. À medida que o endividamento cai, sobra algum saldo para o consumo. E, à medida que começa uma crise, as pessoas mudam os seus hábitos de consumo. Passam a poupar mais porque há incerteza e passam a fazer uma poupança precaucional. A poupança bruta estava perto de 18% do PIB. Com a crise, caiu para algo como 14% do PIB. É muita coisa. O curioso é que, tentando fazer uma estimativa do que ocorreu com a poupança do setor privado nesse período, ela subiu de dois a três pontos percentuais. A implicação é que a poupança pública caiu 7 pontos do PIB.

Valor: Por que a poupança privada aumentou?

Leichsenring: O setor privado está poupando mais seja porque as empresas deixaram de pagar dividendos para tentar se desalavancar, seja porque as famílias resolveram poupar mais. Houve uma queda da poupança do setor público dramática. O déficit [nominal] saiu de 2% a 3% do PIB para 9% a 10% do PIB. É despoupança do setor público na veia. E, na hora em que a economia volta a crescer, é natural esperar que um pedaço dessa poupança precaucional [do setor privado] volte a ser consumida. Por mais que a renda real cresça menos, vai ter algum crescimento de massa salarial, mais desalavacagem, mais essa volta da poupança. Esses fatores ajudam o crescimento a ter certa sustentabilidade.

Valor: E o investimento?

Leichsenring: O investimento também tem um pouco disso. As empresas pararam de fazer qualquer tipo de investimento na hora em que a crise bateu e é normal esperar que aquele investimento de manutenção das máquinas que deixou de ser feito volte a ser feito. Alguma coisa a FBCF sobe no ano que vem. Mas há uma implicação interessante dessa história da poupança para o longo prazo. Daí a nossa avaliação cautelosa de crescimento potencial, de juros neutros [que permitem a economia crescer sem gerar pressões inflacionária], de contas externas ao longo do tempo. Todas elas têm a ver com a taxa de poupança.

Valor: Qual é essa implicação?

Leichsenring: No auge do período pré-crise, o Brasil chegou a investir 21%, 22% do PIB. Com uma poupança de 18% do PIB, nós chegamos a um déficit em conta corrente de 4% do PIB. A definição do déficit em conta corrente é a necessidade de financiamento externo da economia, o quanto você investe em relação à taxa de poupança bruta. A taxa de investimento entrou em colapso. Caiu de 21% a 22% do PIB para 15%, 16% do PIB. O que ocorre é que, para essa queda de investimento, era de se esperar que o déficit em conta corrente tivesse melhorado mais. Houve uma queda brutal do investimento e o déficit saiu de 4% do PIB para 0,6% do PIB, uma queda modesta, dado o tamanho do tombo do investimento. Por quê? Porque a poupança também caiu. E o pior. A poupança caiu por causa da piora da poupança do governo, que tem um caráter mais permanente, porque a nossa estratégia de consolidação das contas públicas é extremamente gradual. É zerar o déficit primário daqui a quatro anos, em 2021, 2022, e o déficit nominal está perto de 8,5% a 9% do PIB, caminhando para 5% do PIB nesse horizonte de tempo.

Valor: Qual a consequência?

Leichsenring: Agora que nós entramos na fase melhor do ciclo há um motivo para poupança privada recuar, e ela não vai ser compensada por uma melhor da poupança pública. Muito gradualmente, a poupança pública tende a melhorar, se o teto de gastos for cumprido, se a reforma da Previdência for aprovada. O que acho que nós teremos nos próximos anos, e não acredito que seja nada rápido, é uma melhora na taxa de investimento com uma poupança que permanece baixa, muito influenciada pelo setor público. Deveremos ter um déficit em conta corrente maior para uma mesma taxa de investimento. Isso diz que, intertemporalmente, a taxa de investimento que conseguimos ter sem incorrer em vulnerabilidades externas é bem mais baixa do que no passado. Isso afeta o crescimento potencial.

Valor: O déficit em conta corrente tende a subir bastante quando a economia crescer mais?

Leichsenring: Acho que voltaremos a ter déficit relevante em conta corrente, de 4% do PIB, quando o investimento chegar a 18% do PIB. Esse déficit hoje é muito baixo, não tendo qualquer vulnerabilidade associada a ele, só que é produto de uma recessão brutal. Não é fruto de uma melhora da poupança e de caráter mais permanente - pelo contrário.

Valor: Como o sr. vê a atividade no terceiro trimestre?

Daniel Leichsenring: Há alguns sinais positivos de que a economia está começando a se recuperar por conta própria. O principal fator é que há uma política monetária muito expansionista. Com uma taxa real abaixo de 3%, não resta dúvida de que estamos num terreno expansionista. Como tudo na economia, isso tem efeito ao longo do tempo. Há um impulso monetário relevante que vai fazer a economia ter uma recuperação cíclica. Há uma combinação de fatores em que esses primeiros aspectos pontuais ajudaram a economia a se levantar um pouco do chão e agora vêm esses fatores mais estruturais. Para 2017, temos projeção de PIB pouco abaixo de 1%. Para 2018, entre 2,5% e 3%. Houve melhora. Tínhamos projeção mais próxima de 0,5% para 2017 e uma bem aberta para 2018, entre 1,5% e 2,5%.

Valor: O juro ficará num terreno mais estimulativo por mais tempo?

Leichsenring: Sim, e há uma coisa interessante. O problema fiscal não melhorou nada - aliás, desde maio, houve piora significativa na perspectiva mais de médio prazo. Mas todas as métricas de risco-país melhoraram. Só conseguimos atribuir isso ao cenário externo. Estamos ganhando de presente condições espetaculares. Infelizmente não estamos usando a oportunidade. Há um crescimento global muito forte, sincronizado, com geração forte de vagas no mundo inteiro, pouquíssima pressão de salários e pressões de inflação muito pouco expressivas, especialmente nos EUA. Há um conjunto de fatores positivos e ao mesmo tempo juros baixos no mundo inteiro. A situação para o Brasil é uma maravilha, o real se valorizou, ajudou boa parte das pressões eventuais de inflação a não se materializarem. E a supersafra, com preços de grãos muito bons, tirou quatro pontos da inflação de um ano para cá.

Valor: Facilitou o corte de juro...

Leichsenring: Sim, aqui fomos beneficiados, primeiro, com a mudança de governo, uma equipe econômica muito boa, um Banco Central bem mais sério, duro, se aproveitando de um câmbio bem mais baixo e preços de alimentação caindo muito. No começo do ano, o Focus projetava 5% de inflação para este ano, vai terminar com 3%, 3,2%, na estimativa do BC. Se pegar a curva de juros no começo do ano, mal chegava a Selic de 10% e o prêmio voltava para perto de 11% a 12%. Hoje falamos de um ciclo finalizando entre 7% e 6,75% ou algo dessa natureza.

Valor: E a taxa deve ficar inalterada por um bom tempo, não?

Leichsenring: Há um hiato do produto relevante, a inércia ajuda neste momento e as expectativas estão ancoradas. Parece pouco provável uma pressão de fato de demanda sobre a inflação se materializar num horizonte de um ano. Depois a situação é bem mais difícil porque haverá o fechamento do hiato do produto...

Valor: Quando?

Leichsenring: Acho que no primeiro semestre de 2019. Há quem tenha avaliação bem mais otimista, acreditando que isso pode ocorrer apenas em 2020, por exemplo. Acho difícil. Talvez no nível macro, mas em questões específicas não há tanta ociosidade assim. Um exemplo que me parece muito claro é a situação dos reservatórios. Está no ponto mais baixo histórico, depois de uma contração do PIB de 7%. Pergunto o que teria ocorrido se a economia tivesse crescido 1% que seja. Haveria quase certamente racionamento. Quando se olha o mercado de trabalho e o nível de utilização de capacidade instalada na indústria parece haver ociosidade grande. Minha dúvida fica mais por conta de outros fatores.

Valor: A Selic termina o ano que vem em 7% ou um pouco abaixo disso ou o BC terá de elevar a taxa?

Leichsenring: Tem muito "se" até lá. Depende de quem for o novo presidente, da agenda, mas acho que dá para ter juros estáveis até o fim de 2018. A partir dali, teria que entrar em algum ciclo de aperto normal. Mesmo elegendo uma plataforma reformista no ano que vem, normalmente nós teríamos que ter algum ciclo de aperto, para devolver a Selic para perto de 9%. Uma inflação de 4% com juro neutro de 5% é mais ou menos o que eu esperaria lá para frente. Se nós vamos tratar ou não dos problemas fiscais, isso vai decidir se a taxa será de 9%, se há alguma chance de ser menor, ou se vai ser 11%, 12%, 14%.

Valor: Sua avaliação ainda é que o teto de gasto não será cumprido?

Leichsenring: Não mudou nenhum centavo. No ano que vem, a nossa estimativa é que os gastos atinjam o teto, e isso porque a inflação ajudou e houve um controle de gastos na boca do caixa relevante. Em relação a 2014, o investimento caiu algo como 70% real e o gasto total do governo federal ficou estável. Por um lado, funcionário público cresceu 7% a 8% real, Previdência subiu algo como 15% real desde 2014 até hoje. Conseguimos cumprir o teto acabando com o investimento. Daqui para frente, o que se consegue reduzir adicionalmente no investimento é muito pequeno e os fatores demográficos da folha vão continuar a subir. A população acima de 65 anos cresce algo como 4% ao ano pelos próximos 20 anos. E nesse debate eleitoral, metade dos eleitores no Brasil tem acima de 54 anos. É por isso que é um tema tão difícil de tratar num ano eleitoral ou a pouco tempo da eleição.

Valor: Como o sr. vê a nova proposta de reforma da Previdência?

Leichsenring: A estratégia de comunicação melhorou, com a mudança de foco no sentido de combater os privilégios. Isso, junto com a mudança no texto e a vontade do governo de progredir, ajudou a aumentar a probabilidade de aprovação. Mas infelizmente ainda há uma percepção equivocada da opinião pública, de que se trata de uma reforma que vai condenar as pessoas a trabalhar até morrer, e isso impõe um ônus relevante sobre a classe política, dada a proximidade das eleições. Dessa maneira, ainda que maiores, ainda nos parece que as chances de aprovação sejam baixas em 2017. A reforma ideal não é politicamente viável, de modo que faz sentido tentar resolver bem resolvido algum aspecto, como por exemplo a idade mínima e a transição, deixando para depois outros aspectos. O que veríamos com mais preocupação é se a proposta atacasse todos os temas de maneira insuficiente, e que voltássemos à estaca zero a partir de 2019, já tendo incorrido no custo político de uma reforma dessa natureza, que eventualmente minasse a chance de novos progressos no futuro.

Valor: O cenário de um crescimento de 2,5% a 3% está condicionado à vitória de um reformista?

Leichsenring: Acho que em 2019 haverá consequências maiores. Para ter efeito muito grande sobre a taxa de crescimento de 2018, tem que ser um resultado bem dramático, uma parada súbita da economia. Como as eleições são em outubro, não acho que haverá. Se ficar claro desde o começo que vai ser um desastre aí pode ter efeito, mas não é o cenário mais provável.

Valor: Como resolver o fiscal?

Leichsenring: Houve menos avanços estruturais do que nós gostaríamos. Partimos de um déficit primário recorrente, tirando receitas extraordinárias, da casa de 3% do PIB. É algo como R$ 200 bilhões. O Brasil precisa caminhar no sentido de um superávit primário de uns 2% do PIB, uns R$ 150 bilhões, pelo menos para estabilizar a dívida. Há pelo menos um ajuste de uns R$ 300 bilhões a R$ 350 bilhões para fazer, é 5% do PIB de ajuste. Pela estratégia gradualista, faremos isso em mais de uma década. Não acho razoável.

Valor: Vai ter que aumentar impostos em algum momento?

Leichsenring: Não temos como nos livrar de um aumento de impostos significativo. Boa parte do gasto que poderíamos cortar já cortamos. Se forem reduzidos ainda mais, poderia comprometer o próprio funcionamento do Estado. Imagino que pelo menos metade da conta será paga com aumento de carga tributária. A alternativa é pior, ter dívida pública subindo.

Valor: Os sr. concorda com a visão de que a melhora da economia poderá eleger um reformista?

Leichsenring: A melhor abordagem para prever o resultado de uma reeleição é olhar qual era o nível de aprovação e quem era o candidato do governo. Nas reeleições, isso é muito direto, porque o candidato a reeleição consegue converter aproximadamente 85% das pessoas que avaliam o governo como ótimo e bom e essa conversão de voto é extremamente estável nos anos de reeleição e ele consegue converter algo como 40% a 45% daquelas pessoas que avaliam o governo como regular. Olhamos 185 eleições no mundo. No Brasil, em eleições federais, um presidente que tenha ótimo e bom entre 35% e 40%, a chance de se reeleger é altíssima e esse era o motivo pelo qual acreditávamos na vitória da Dilma em 2014. Em anos de não reeleição esses índices caem significativamente. Para fazer sucessor, a avaliação do governo precisa ser substancialmente mais alta. É o que o Lula tinha em 2010 e o FHC não tinha em 2002.

Valor: Esse é o quadro de 2018.

Leichsenring: Por que eu não acredito nessa história de que a economia "bombando" vai eleger presidente reformista? Presidente com avaliação inicial de 73% de ruim e péssimo, mesmo que melhore no ano que vem - e a evidência internacional é a de que todos os presidentes melhoram sua avaliação em anos eleitorais - nos parece muitíssimo pouco provável que chegue a um nível de popularidade que o candidato do governo seja beneficiado. Se melhora a avaliação algo como 10 pontos percentuais, seriam 63% de ruim. Com esse nível, qualquer candidatura vinculada a ele é tóxica.

Valor: Terá que ter a agenda dele mas não identificado com ele?

Leichsenring: Tem que ser de oposição, ainda que tenha a mesma agenda. É um malabarismo retórico significativo. Outro fator relevante é o grau de revolta do eleitor contra a classe política. Alguém não vinculado ao establishment político tem mais chance do que jamais teve. Há outros fatores: tempo de TV, capacidade de articulação, a campanha de 2018 vai ser muito mais curta, isso fortalece muito quem já é conhecido.

Valor: Quem será o candidato do mercado?

Leichsenring: Qualquer um que seja identificado com certa continuidade do que está aí.

 

Setor privado está vulnerável a choque externo

No caso de um choque externo que leve a uma forte valorização do dólar, o elo mais fraco das economias emergentes atualmente é o setor privado. O professor de economia e ciência política da Universidade da Califórnia e ex-assessor do Fundo Monetário Internacional (FMI), Barry Eichengreen, ressalta que as empresas das economias em desenvolvimento se beneficiaram nos últimos anos de um maior acesso aos mercados internacionais na busca por financiamento, mas isso cobrou um preço: tornaram-se também mais vulneráveis a uma reversão das condições financeiras globais, como a que ele próprio prevê em 2018. "O lado mais fraco dos mercados emergentes hoje é o privado", disse o economista em entrevista ao Valor.

Eichengreen, que esteve em São Paulo a convite da Itaú Asset Mangement, afirmou enxergar o setor público dos mercados emergentes, entre os quais o Brasil, como mais resilientes a um eventual choque.

Segundo o economista, muitos países, após enfrentar crises cambiais no passado, conseguiram reduzir consideravelmente as vulnerabilidades, com menor exposição de dívidas em dólar e grandes reservas internacionais, além de dependência mais restrita de financiamento externo. "Taxas de juros e dólar em alta podem tornar o serviço das dívidas mais difícil para países como a Turquia, que têm alta dependência de financiamento estrangeiro e grande dívida externa", disse.

No caso das empresas, "a diferença atual em relação ao passado é que as corporações emergentes têm mais acesso aos mercados internacionais, o que é um grande progresso, mas também um foco de vulnerabilidades".

De fato, dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostra que, desde quando o Brasil recebeu o grau de investimento em 2008 pelas principais agências de classificação de risco de crédito, as emissões de renda fixa corporativa no exterior multiplicaram de tamanho. Em 2008, as companhias nacionais tinham emitido apenas US$ 6,7 bilhões em dívida.

No ano seguinte, o montante saltou para US$ 26,2 bilhões. O pico da captação no exterior pelo setor privado brasileiro ocorreu em 2012, quando as emissões das empresas somaram US$ 50,7 bilhões. O Brasil perdeu o grau de investimento pelas três principais agências entre setembro de 2015 e janeiro de 2016, mas o apetite por títulos do país permaneceu alto no mercado internacional diante de um ambiente de retornos historicamente baixos nas economias avançadas.

Neste ano, até outubro, a dívida nova corporativa brasileira tinha alcançado US$ 26,5 bilhões, segundo informações da Anbima. "Os investidores no atual ambiente de taxas reduzidas encontraram os 'yields' [retornos] desejados nos mercados emergentes, como o Brasil", explica Eichengreen.

Dados do Banco Central do Brasil também corroboram a percepção de crescimento da exposição corporativa ao dólar. A dívida externa não governamental, excluindo bancos, subiu 64% em sete anos. O estoque saltou de US$ 65 bilhões no fim de 2009 para US$ 107 bilhões em junho deste ano.

O professor da Universidade da Califórnia alerta para o que classifica como principal risco aos mercados globais em 2018: uma mudança repentina do ritmo de alta de juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano).

Conforme Eichengreen, com a economia dos EUA no pleno emprego, a reforma tributária em análise pelo Congresso americano pode acrescentar combustível extra às pressões inflacionárias. "O corte de impostos pode levar o Fed a acelerar as altas de juros e isso seria um choque para os mercados", diz.

A atual taxa de desemprego dos EUA, de 4,1% registrada em outubro, está no menor nível em 17 anos. E, segundo o economista, o aperto no mercado de trabalho, com escassez cada vez maior de profissionais, começa a mostrar impacto sobre os salários. "O tempo da inflação de salários adormecida nos EUA está no fim", afirma.

Dentro desse cenário, Eichengreen diz acreditar na possibilidade de o Fed efetuar mais do que as três ou quatro elevações de taxas estimadas pelo mercado. "Se o banco central esperar demais, pode entrar em uma situação de ter de começar a subir os juros em todas as reuniões", afirma. O economista defende um ajuste mais rápido para o ritmo da política monetária americana: "O Fed deveria subir os juros já". Um banco central americano mais agressivo levaria a uma apreciação do dólar acima do previsto. "Tudo vai depender de como a inflação de salários vai se comportar, mas até o momento não havia inflação de salários", diz.

O economista ressalta, porém, que "agora há sinais de que a pressão começou e os indícios vão surgir cada vez mais". Para o acadêmico, nessas condições, o mercado tende a se antecipar a uma eventual mudança de velocidade do Fed. "Se a guinada na política monetária for muito súbita, os mercados podem ser pegos de surpresa", diz.

Nesse caso, existiria o risco de uma correção dolorosa dos "yields" no mercado de renda fixa e uma eventual fuga de capitais dos emergentes. Outro fator que amplia a possibilidade de o Fed ter de acelerar o aperto monetário vem da própria renovação pela qual passa a instituição. O conselho diretor do banco central americano terá quatro assentos vagos quando a atual presidente, Janet Yellen, terminar o mandato em fevereiro de 2018.

A comandante do Fed será substituída na função pelo atual diretor Jerome Powell. "Com novo presidente e poucas vozes dispostas a falar mais alto para advogar mudanças, pode ser que o Fed permaneça no rumo atual por tempo demasiado."

BANCO DE TALENTOS

ÁREA DO ASSOCIADO

O Sinduscon/RN pensa como você, e por isso trabalha:

NOSSA MISSÃO

Representar e promover o desenvolvimento da construção civil do Rio Grande do Norte com sustentabilidade e responsabilidade sócio-ambiental

POLÍTICA DA QUALIDADE

O SINDUSCON/RN tem o compromisso com a satisfação do cliente - a comunidade da construção civil do Rio Grande do Norte - representada por seus associados - priorizando a transparência na sua relação com a sociedade, atendimento aos requisitos, a responsabilidade socioeconômica, a preservação do meio ambiente e a melhoria contínua.

CONTATO

55 84 3206 5362

contato@sindusconrn.com.br

SOCIAL

LOCALIZAÇÃO

Rua Raimundo Chaves, 2182 - Sala 101 Empresarial Candelária - Candelária - Natal/RN

SINDUSCON/RN (C) 2012 - TODOS OS DIREITOS RESERVADOS